Câncer primário de fígado é o sexto tipo de câncer mais comum no mundo e a terceira mais comum causa de morte relacionada a câncer. HCC representa 90% dos casos de câncer primário de fígado e em 90% das vezes ocorre em pacientes com doenças hepáticas crônicas como esteatohepatite, hepatites virais (B, C , Delta), autoimunes, alcoólicas e outras.
Cerca de 20 a 25% dos transplantes de fígado (TF) são realizados em pacientes portadores de HCC.
O TF é indicado no HCC quando os tumores encontram-se dentro de certos critérios, chamados critérios de Milão, que indicam bons resultados com o TF para tratamento do HCC e foram adaptados para serem previstos baseados em exames radiológicos (tomografias e ressonâncias). Assim, os laudos dos radiologistas são utilizados por câmaras técnicas compostas por transplantadores para classificar os pacientes como dentro ou fora destes critérios e então permitir ou não que sejam incluídos em lista de espera para transplantes. De acordo com estes critérios, podem ser transplantados pacientes com até 1 tumor não maior que 5 cm ou até 3 tumores não maiores que 3 cm, sem extensão da doença para fora do fígado e sem invasão vascular pelos tumores.
Entretanto, diversos estudos que comparam as dimensões dos exames radiológicos com as medidas realizadas após a remoção dos tumores por ressecção ou transplante, já demonstraram que os exames radiológicos, por mais sensíveis que sejam, apresentam erros na avaliação do tamanho dos tumores em 20 a 30% dos casos, superestimando lesões e impedindo pacientes em condições de entrar na lista e subestimando outras e consequentemente inserindo na lista pacientes que não poderiam estar lá pela lei vigente.
Da mesma forma, existem outros critérios além dos critérios de Milão que certamente influenciam nos resultados, de uma forma inclusive mais sensível. Vários pesquisadores já demonstraram que os tumores pouco diferenciados apresentam piores resultados em relação aos bem diferenciados e estes dados só podem ser obtidos através de biópsias que são seguras atualmente com uma chance de 1 a 3% de disseminar o tumor ao longo de seu trajeto na ocasião da sua realização.
Um grupo inglês, do Hospital Universitário de St James, avaliou 60 pacientes transplantados por HCC cujos tumores foram comparados aos exames radiológicos e avaliados quanto o seu grau de diferenciação.
Houve 45% de discrepância entre os achados radiológicos e o exame anátomo-patológico (análise do explante) em relação ao número de tumores e 64% de discrepância em relação ao tamanho das lesões (para aqueles dentro dos critérios de Milão). Em tumores maiores (até 8 cm) esta discrepância foi menor .
Quando realizada avaliação do grau de diferenciação, um terço dos pacientes com mais que um nódulo apresentavam graus de diferenciações diferentes em nódulos diferentes.
Análises dos dados mostraram que houve correlação entre pouca diferenciação do tumor e invasão vascular e estes dois, associados a alfafetoproteínas > 400 ng/ml foram relacionados a recorrência do HCC e pior sobrevida do paciente.
Conclui-se neste estudo que a avaliação radiológica é insuficiente para definição de critérios de indicação ou exclusão de portadores de HCC para TF e que a análise histológica é mais precisa porém sua análise ainda é difícil e pode enganar-se em 1/3 dos casos. A expansão dos critérios para lesões maiores diminui os erros e as injustiças pré-transplantes apesar dos riscos de prejuízo dos resultados de longo prazo após o TF.

(Young e cols, HPB junho 2013)